Cuidado com a batina!
Sei que o título deste artigo
soa estanho. Mais ainda vindo de um padre que usa sempre a batina. Mas eu
repito: cuidado com a batina!
Se me permitem, eu me explico.
Para tanto, temos que recordar
o sentido da batina. E quando digo batina, entenda-se o hábito sacerdotal, seja
a batina mesma ou o clergyman, ou outra veste sacerdotal.
A batina tem como fim ser um
sinal para os outros e para o padre.
Para os outros a batina ajuda a
identificar o sacerdote em meio a outras pessoas. O padre, como nos dizia o
Beato João Paulo II, não pode perder-se no anonimato. Ele é sinal de Deus. É
luz, é referência. Ele tem que ser visto, tem que ser encontrado com
facilidade. E o hábito sacerdotal ajuda a identificar o padre.
A vista de um padre nos leva a
pensar em Deus, a lembrar-nos de Deus de quem o padre é sinal e mais ainda,
ministro. Se estamos num perigo e vemos um policial, nós nos tranqüilizamos e
vamos até ele pedir ajuda. A farda não faz o policial, mas facilita
encontrá-lo, identificá-lo. Como também o nome de uma loja não é a loja, mas
ajuda a encontrá-la. A batina não é o padre. O poder não está na batina. Mas a
batina ajuda muito a encontrar o padre.
E para o Padre?
O hábito o ajuda a não se
esquecer de sua missão, de sua entrega a Deus.
A batina é para o padre
proteção, alerta e às vezes, até sinal vermelho.
Alerta porque se ele está com a
sua veste própria, é convidado a agir como sacerdote. O hábito lembra ao padre
uma coisa que muitas vezes não queremos aceitar: o padre não é uma pessoa
comum. Não é um homem como os demais. Não. O jovem que é chamado por Deus e é
ordenado padre, sim, é um homem como os demais. Mas, enquanto sacerdote, não é
mais como os demais. Houve uma mudança em seu próprio ser. Ele não se pertence
mais, não tem direito de agir como se não fosse sacerdote. Isso o próprio povo
de Deus espera de nós. O povo quer e tem direito de ver no padre um padre.
Às vezes também a batina pode
ser um sinal vermelho para o padre no sentido em que como sacerdote, vestido
como padre, ele não pode tomar certas atitudes, ir a certos lugares, etc.
A batina é ainda um desafio
para o padre. Temos que ser o que a batina representa.
Por isso eu digo: cuidado com a
batina. Cuidado, meu irmão padre, para não se esquecer de seu hábito que lhe
recorda sua identidade. Cuidado com a batina, pois ela o sinaliza. Suas ações e
atitudes são vistas como ações de um ministro de Deus.
Mas quando digo aqui “cuidado
com a batina”, eu quero mesmo é insistir num outro aspecto totalmente
diferente.
Um dos grandes significados da
batina é lembrar ao padre e aos outros que ele abriu mão de muitas coisas para
se dedicar a Cristo, na simplicidade, na pobreza, numa vida austera, embora
cheia de alegria. Ou seja, a batina nos convida a renunciar a roupas
ostensivas, roupas de marca, cores preferidas por nós, roupas da moda, etc. Por
isso se diz que a batina é sinal de morte para o mundo. Neste sentido.
Mas eu percebo um pouco hoje
entre nós padres e, talvez, mais ainda, entre seminaristas, uma atitude que é
uma grande incoerência: usar a batina por vaidade. Fazer da batina um meio de
ostentação. Já viram na internet fotos de padres e seminaristas fazendo poses
de batina, querendo imitar fotos antigas, um pezinho pra frente, olhar para o
infinito, uma boa quantidade de gel no cabelo, etc., etc.?
A batina que tem que ter não
sei quantos botões, em honra dos anos da vida de Jesus, das bem-aventuranças,
dos coros angélicos... O tecido tem que ser tal que para dê uma boa caída. A
faixa tem que ter tantos centímetros de largura, uma franja bem entrelaçada
para lembrar a rede de São Pedro. A capinha para imitar S. João Bosco. O
solidéu... Outro dia um jovem desistiu de nosso Seminário porque me perguntou
se nossos seminaristas usavam solidéu e eu disse que não. Imaginem. Uma vocação
condicionada a um solidéu...
E o preço que às vezes se paga
por uma batina, porque tem tal tipo de corte, é de tal marca... Até a batina
virou roupa de marca.
O que acontece então? Aquela
veste que seria um convite à simplicidade e à pobreza, torna-se ocasião de
vaidade, de ostentação, de consumismo.
Nestes casos, o uso da batina
não serve para mostrar a condição de ministros de Deus, mas para a pessoa se
mostrar, se exibir através da batina.
Mais triste ainda quando a
pessoa que faz uso da batina tem um comportamento que não condiz em nada com a
condição de discípulos de Cristo, mortos para a vaidade e para as coisas
mundanas.
Por isso digo: cuidado com a
batina!
Não estou defendendo que não se
use a batina. Até porque eu só ando de batina. Quero dizer que devemos usá-la
corretamente. Ter cuidado porque o diabo, que se veste de anjo de luz, pode
também querer usar da batina para nos fazer cair no contrário de tudo o que ela
significa e nos recorda.
Cuidado com a batina! Cuidado
para não deixar de lado este grande sinal.
Cuidado para não usá-la mal,
deformando o seu significado.
Cuidado para não transformar o
remédio em veneno.
Cuidado para não transformar o
hábito que é um sinal do que trazemos lá dentro de nós, em uma capa que esconde
o que lá dentro não está bem.
Dizer "cuidado com a
batina" não é um convite para não usá-la, mas um apelo a usá-la
corretamente, segundo o que realmente ela é e nos lembra: sinal de morte às
coisas mundanas, entrega e consagração a Deus como seus ministros no seguimento
de Cristo, a serviço de nossos irmãos.
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